Foi no ano de 1970, quando fui morar na rua Saudável, no bairro Medianeira em Porto Alegre. Fiz amizade com meu vizinho que era um pouco mais novo que eu "José Luís". Sua irmã Rosângela estava sempre por perto. Enquanto ela brincava com as bonecas, jogávamos futebol de botão. Após uma rodada de muitos gols, íamos assistir os Thunderbirds na TV que ainda era em preto e branco. Zé Luís era gremista enquanto eu era colorado. No jogo de botão nosso clássico preferido era o Fla-Flu. Ele tinha o Fluminense e eu o Flamengo (coisa que hoje jamais eu faria, pois sou anti Flamengo e Corínthians). Lembro que no "meu" Flamengo, tinha um centroavante chamado "Fio", era aquele que deu origem à música "Fio Maravilha" gravada pelo Jorge Ben e pela Maria Alcina, e o craque do time que se chamava Zanata. Zanata foi transformado no que seria hoje o Messi dos botões. Era o que mais fazia gols, pois era também o que mais chutava (ou o que com o qual eu mais chutava). Minha propaganda do Zanata era tanta, que o Zé Luis um dia sem eu ver "sequestrou" o Zanatta. Um belo dia de Fla-Flu, procurei Zanata por todos os cantos e nada do craque. Quase tive um pire-paque. Comuniquei ao meu amigo Zé Luís que não haveria mais Fla-Flu. Como num clássico tão importante em pleno ano de 1972 eu colocaria meu time sem seu maior craque ?
Procurei por tudo. Aonde estaria o Zanata ? Embaixo de algum guarda-roupa ? Alguém teria pisado e quebrado? O coitado já havia sido feito de plástico quebrado em uma forminha de empadas (das pequenas) e poderia ter retornado ao mesmo estado, tipo: do pó vieste e ao pó retornarás.
Fiquei triste pois não havia jeito de encontrar o valioso craque. Minha mensagem de tornar o Zanata um grande craque havia feito não só a minha cabeça mas também a do Zé Luís. Impressionado em sua cabeça com a idéia de que o botão era mesmo mágico e fazia grandes jogadas, Zé Luís deixou-se levar e admitiu-o como sendo mesmo um cracão.
Sentindo que o "sequestro" de Zanata havia tido grande repercussão (pelo menos no nosso meio futebolístico) Zé Luís ofereceu-se para me ajudar a procurar o Zanata.
Como amigo é para essas coisas, Zé Luis olhou para o chão, em frente à minha casa, e avistou o Zanata no solo com um pouquinho de terra por cima, dizendo: "achei".
Era muita coincidência, mas fiquei tão feliz, que nunca mais falei no "sequestro" e sim fazer muitos Fla-Flus, os quais eram numerados assim como qualquer clássico do futebol. O meu amigo foi o primeiro a ter botões tipo puxador, pois até então, eram só os panelinhas.
Lembro que escutávamos muita música com nossos compactos simples e duplos e nossos LPs. Zé Luís tinha um LP do Renato e Seus Blue Caps do ano de 1969 que escutávamos em sua vitrolinha. Gastávamos as músicas "Cláudia" e "Quando a Cidade Dorme" de tanto ouvir.
Uma vez estávamos jogando futebol, de bola mesmo, na calçada, na Av. Natal, próximo ao antigo estádio do Cruzeiro de Porto Alegre, com o Paulinho (amigo do Zé Luís). Acontece que a bola, que era minha, caiu no páteo de um vizinho, o tal de Vasco. E não é que o homem pegou uma faca e espedaçou minha bola.
Ficamos brabos e chamamos o pai do Zé Luís que era chamado de Santos. Começamos a rir e dissemos: bom agora é o Vasco contra o Santos.
Alguns anos depois, meu amigo Zé Luís foi morar no Rio de Janeiro com a família, lá fez amizade com meu primo Marcelo que é carioca da gema e por influência do mesmo virou botafoguense.
Certa vez vi Zé Luís na casa de sua prima Adriana na avenida Tronco em Porto Alegre. Ele havia voltado para Porto Alegre. Nos cumprimentamos, meio como se fôssemos estranhos.
Depois nunca mais vi meu amigo Zé Luís. Soube que o mesmo havia se formado em educação física e estava exercendo a profissão. Sou bom de memória e gravo o nome completo das pessoas, mas do Zé Luís não consigo lembrar seu sobrenome, acho que era Santos.
Ficou a lembrança daquele tempo bom em que se faziam brincadeiras sadias e se escutava muita música de Jovem Guarda.
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